Francês lança romance policial com forte conotação política e social em Pernambuco

Um país cheio de contradições, onde a violência social predomina e as forças antagônicas se enfrentam brutalmente. Um romance que joga luz crua sobre esse cenário. E um autor que, segundo o escritor Alberto Mussa, “se insere na velha e longa linhagem de intelectuais e artistas franceses que ousam enfrentar o enigma brasileiro”. Assim é definido O ouro de Quipapá, do francês Hubert Tézenas, lançado originalmente na França pela Les Éditions L’Ecailler, com o título de L’or de Quipapá, e que chega agora ao Brasil na tradução de Fernando Scheibe, pela Editora Vestígio, especializada em romances policiais.

A obra inaugura uma nova linha editorial da casa, em que a qualidade da narrativa se evidencia à medida que a trama é tecida diante do leitor. O crime é apenas um dos temas deste romance excepcional, que vai muito além do policial, configurando-se como uma crítica social implacável a uma sociedade na qual a verdade tem pouco espaço, e a honestidade, valor meramente opcional, não resiste aos poderosos.

Tézenas viveu durante oito anos no Brasil, na década de 1990. “Não buscava nada em particular, a não ser esquecer uma decepção amorosa, ter uma vida mais aventureira e encontrar pessoas diferentes. E foi quase por acaso que acabei morando em Pernambuco”, revelou em entrevista ao Jornal do Comércio, por ocasião do lançamento de sua tradução para o francês do primeiro romance de Raimundo Carrero, A história de Bernarda Soledade. “Esses anos em Pernambuco foram, para mim, uma experiência decisiva, inesquecível. Em termos de bondade, paixão, mentira e violência, tenho a impressão de saber agora do que o ser humano é capaz”, comenta sobre sua experiência no Brasil.

No romance, um homem comum, corretor de imóveis, é testemunha de um crime no escaldante e abafado outono nordestino de Recife, em 1987. Alberico Cruz, antes principal suspeito, torna-se o culpado ideal. Acusado de assassinar Teotônio de Jesus Policarpo, um sindicalista, o anti-herói se vê brutalmente lançado no inferno da prisão. Sua luta pela sobrevivência o introduz em um mundo de violência do qual nada conhece: o mundo dos senhores da cana-de-açúcar, às portas do sertão pernambucano. 

É nesse mundo que outro enredo se desenrola. Kelbian, filho do dono de uma das maiores destilarias do Nordeste, da família Carvalho, tem um meio-irmão chamado Tiago. Em uma conversa, Tiago fala sobre avelha mina do Alemão, que se encontra em suas terras. Kelbian então traz um geólogo de São Paulo para analisar o terreno. As conclusões são categóricas: ouro tem, só precisa cavar. Para que nada fosse descoberto e tudo acontecesse da maneira mais rápida possível, os irmãos mantêm os empregados em regime de trabalho escravo, sem nenhuma liberdade. Tudo começa a vir à tona com as investigações sobre a morte do sindicalista, revelando um universo infausto, gangrenado pela corrupção. 

Tézenas utiliza o assassinato do líder sindical, ou seja, o mote do romance policial, como meio de descrever a incrível dureza da vida dos cortadores de cana pernambucanos da época, por meio de uma escrita sóbria e forte. “A situação me parecia muito sombria: um país fechado, um sistema latifundiário completamente arcaico e bloqueado, os militares ainda nos bastidores do poder”, relata.

“O leitor acompanhará o livro com grande paixão pela qualidade das palavras, pelo envolvimento dahistória, pelos personagens tão bem construídos quanto vivos e atuantes. Isto mesmo, quem estiver lendo esse romance se sentirá atraído por um grande sonho, vivendo todas as circunstâncias e situações”, observa o escritor Raimundo Carrero. Segundo ele, "Hubert Tézenas não é apenas um autor de romance policial. É, sobretudo, um grande autor, com tratamento artístico, do texto e dos personagens".

Para Edney Silvestre, “com seu conhecimento e afeto pelo ‘Brasil profundo’, o tradutor de meus livros para o francês mostra ser, ele mesmo, um escritor com recursos maduros, aqui amparados em uma trama engenhosa e surpreendente”. Alberto Mussa completa: “Garanto que o leitor se sentirá em casa”.

A primeira versão da obra foi escrita em apenas três semanas, em 1991, entre Recife e Palmares. “Perdi o manuscrito, me dediquei à tradução e só reencontrei o texto 17 anos depois, em 2008. Vi logo os defeitos e refiz tudo”, comenta o autor. Após 12 anos longe do Brasil, Tézenas retorna ao país para lançar a obra em várias cidades (confira a seguir sua programação).

Sobre o autor
– Hubert Tézenas traduziu para o francês importantes autores brasileiros, como Edney Silvestre, Raimundo Carrero e Alberto Mussa. Este é seu primeiro romance, ambientado no Brasil com perfeição devida aos anos que aqui viveu. 

TítuloO ouro de Quipapá 
Autor: Hubert Tézenas
Tradução: Fernando Scheibe
Número de páginas: 176
Formato: 14 x 21 cm
Preço: R$ 34,00
ISBN: 978-85-8286-093-9

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