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Diante de toda a polêmica suscitada nas redes sociais acerca do vazamento do vídeo de um famoso jornalista, muito se disse que o problema está no termo "preto" em si, mas discordo e, já que estamos usando literatura e música, lanço mão de uma letra dos Titãs: "palavras não são más". Aqui, chamo a atenção para a intenção comunicativa: o desejo de ofender, de humilhar.
Os exemplos de uso dos termos "preto" ou "negro" são fartos. Nas narrativas de Sagarana, de João Guimarães Rosa, aparece; nas poesias de Castro Alves e Menotti del Picchia, aparece; na alcunha de Neguinho da Beija-Flor, Raça Negra e Negritude Junior, e nas letras cantadas por Gal Costa e Alcione também. Ser um "negão de tirar o chapéu" está bem longe de qualquer abordagem pejorativa ou estereótipos de desvalorização, aliás; como se diz atualmente, é ser um "homão da porra".
É claro que existem também inúmeros exemplos do negro inferiorizado e estereotipado em nossa literatura, herança dos séculos em que fomos uma colônia escravocrata, mas os problemas de preconceito racial no Brasil e – no mundo, arrisco-me dizer, vão além da raça e atingem homossexuais, mulheres, deficientes físicos, e não podem, portanto, serem reduzidos ao uso de um termo visto como “politicamente incorreto”. O problema é maior: reside no fato desses grupos receberem menos dinheiro pelos mesmos serviços prestados, pelos jovens desse grupo serem agredidos com mais frequência – física e verbalmente; de terem maior dificuldade para conseguir emprego ou ingressar em universidades públicas. O preconceito se materializa quando, de acordo com o Mapa da Desigualdade, um cidadão residente na cidade de São Paulo tem expectativa de vida 40% maior ao viver no Jardim Paulista, em comparação ao que vive no Jardim Ângela; para esse estudo, foram usados 30 indicadores socioeconômicos.
É fundamentalmente importante que nos dias atuais, com o reaparecimento de movimentos que enaltecem a ideologia nazista, com casos e mais casos de morte de jovens negros em situações escusas ou com a persistente agressão a mulheres e homossexuais, a sociedade brasileira reflita e cobre seus representantes nas casas legislativas acerca de políticas públicas efetivas para minorias em situação constante de alerta. E que casos como o do jornalista global não sejam vistos como mero desvio, nem tampouco defendidos por ministros da Suprema Corte.
João Paulo Vani é Presidente da Academia Brasileira de Escritores, Mestre em Teoria Literária e Doutorando em Letras pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da Unesp de São José do Rio Preto. Contato: jpvani@editorahn.com.br
==> Foto: Daniela Silva - bloguer
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