De volta à rotina depois da 8ª cirurgia, Hypolito garante: ‘Não vou desistir’

Quando o portão do Centro de Treinamento do Velódromo, no Rio de Janeiro, se abre, Diego Hypolito sorri e cumprimenta cada pessoa que passa pelo seu caminho até chegar ao solo, sua “casa” nos últimos anos. A cena pode parecer comum para qualquer atleta de alto nível. Mas a simples chance de treinar tem sido uma façanha rara e muito cobiçada pelo ginasta do Flamengo. Seu corpo carrega as marcas e as consequências de oito cirurgias. Quatro delas apenas no último ano. O mesmo 2012 que viu novamente uma das esperanças do Brasil nos Jogos Olímpicos cair exatamente na hora em que não poderia falhar. Ainda que lutando contra as dores e buscando forças para superar as decepções, preserva intacto o sonho de subir ao pódio olímpico. Esta semana, depois de quase seis meses afastado, começou a reescrever a sua história em busca da única medalha que ainda lhe falta.

- Ainda tenho muita esperança que ainda vou conseguir a medalha olímpica. Não vou desistir. Mas meu corpo precisa respirar mais um pouco, tem que ter mais vida – afirmou Diego Hypolito, tentando equilibrar a vontade de subir ao pódio com o peso dos 19 anos de dedicação ao esporte.

Para realizar seu sonho, nos Jogos do Rio de Janeiro, em 2016, o bicampeão mundial pretende diminuir a quantidade de competições. Dentre as resoluções para 2013, estão também acabar com os treinamentos à base de analgésicos e diminuir os “encontros” constantes com os centros cirúrgicos. Com um “corpo mais saudável”, como ele mesmo faz questão de frisar, acredita que terá um caminho mais tranquilo até seu último objetivo. Mas, se ainda assim a medalha não vier, seguirá tendo a certeza de que a ginástica transformou sua vida.

- Já tive até que vender refrigerante na praia. Foram coisas muito piores. Então, tenho que ser muito grato. Tenho é que querer treinar a cada dia mais. A dor é muito pequena perto de toda a oportunidade que pude dar para a minha família - afirmou o ginasta, que ainda se recupera da última cirurgia, no pé direito, realizada em outubro.

Confira na entrevista a seguir esses e outros assuntos que envolvem a vida e carreira de um dos principais ginastas do país.
 
Como está se sentindo nesses primeiros dias de treino?
Ainda estou bastante acima do peso. Estou com 3,400 kg a mais. É menos do que eu achava, mas não estou 100%. Ainda me sinto um pouco desnorteado nos treinos, meio sem ritmo. Fiquei muito tempo sem treinar. Depois de Londres, só treinei uma semana. Mesmo assim, não consegui fazer nada. Nesse período, fiquei bastante tempo totalmente parado para me recuperar. Foram dois meses e meio andando de muletas e mais dois meses e meio sem mexer o ombro. Não tinha muito o que fazer. Tinha que esperar. Estava muito ansioso para voltar. Isso aqui é a minha vida, independentemente de qualquer circunstância. O ano passado foi difícil, mas quero entrar esse ano com o pé direito, quero ter bons resultados.

Depois de um ano tão difícil, o que te faz ainda querer se superar?
É claro que todo mundo vai lembrar sempre que caí nas duas últimas Olimpíadas. A minha carreira sempre foi muito de altos e baixos. Mas também é assim na vida. Não tem como me manter 100% sempre. Sou um ser humano como outro qualquer. Depois das Olimpíadas, dei cerca de 20 palestras. Na primeira, foi muito difícil, estava muito triste, muito ferido depois de ter caído de novo. Afinal de contas, quem quer mais acertar do que todo mundo sou eu. Mas vi nessas palestras o quanto cresci com a ginástica. Foi uma oportunidade de mudança de vida. Muitas pessoas não tiveram a oportunidade que tive. A gente era muito pobre. Nossa família toda morava em um único quarto. Uma vida totalmente humilde. Quando viemos para o Rio, tivemos muitas dificuldades. O que o meu pai ganhava no dia era para a gente comer no mesmo dia. Já tive até que vender refrigerante na praia. Foram coisas muito piores. Então, tenho que ser muito grato. Tenho é que querer treinar a cada dia mais. A dor é muito pequena perto de toda a oportunidade que pude dar para a minha família.

Você chegou em Londres com muitas lesões. Se fosse em uma outra competição, acredita que nem disputaria?
Não gosto de falar dessa maneira, pois não quero parecer que estou dando desculpas por algo que aconteceu. Eu realmente caí. Assumo o meu erro. Não podia deixar de tentar, independentemente das circunstâncias. Eu acreditava em mim, achava que era possível. Ainda consegui fazer um treino de pódio bom, mesmo com dor. No dia seguinte, tive uma lesão um pouco grave no pé e não consegui treinar. Mas isso não é uma desculpa. O que posso dizer é que, possivelmente, chegaria mais inteiro se estivesse com menos lesões. Mas ainda tenho muita esperança que ainda vou conseguir a medalha olímpica. Não vou desistir. Mas meu corpo precisa respirar mais um pouco, tem que ter mais vida.

De Londres para cá, você conseguiu treinar?
Tentei treinar para ajudar o meu clube no Campeonato Nacional, mas não tinha mais a menor condição. Não posso mais tomar remédio para treinar. Não é saudável você ter que tomar remédio para conseguir treinar. É saudável sem remédio, como estou fazendo esse ano e como pretendo fazer esse ciclo todo. Se tem uma lesão, tem que cuidar da lesão, tem que dar tempo ao tempo. É claro que nas Olimpíadas isso é diferente, é um objetivo diferente. Queria treinar com dor ou sem dor.

Como avalia sua recuperação das últimas cirurgias no ombro e no pé?
As cirurgias já estão agora mais em um processo de fortalecimento. Então, é importante não deixar de ir à academia, não deixar de fazer os fortalecimentos em conjunto com a parte de manipulação e de aparelhos. Não sinto mais dor na parte do meu pé que fiz a cirurgia. Estou tendo fascite justamente porque ganhei mais movimento. No ombro, ainda está faltando movimento. Ainda sinto um pouco de dor, mas não muito também. Agora é mais a questão do tempo que fiquei sem trabalhar. Eu não faço barras, paralelas, cavalo com alças, argolas há mais de um ano. Agora, temos feito o básico do solo. A barra estou voltando a fazer, mas ainda sinto dor para alongar o meu ombro. Nas argolas, ainda não fiz nada. Só preparo. O cavalo com alça e as paralelas estou tentando voltar, mas, como fiquei muito tempo sem fazer esses aparelhos, ainda sinto um pouco de dor.

Durante o treino, você parecia fazer cara de dor em alguns momentos. Ainda sente muita dor?
É a dor da reabilitação mesmo. Não é a dor de lesão, como estava tendo no ano passado inteiro, quando operei quatro vezes. Isso não é muito comum, nem é bom. Não é algo saudável.

Quais são seus planos para essa temporada?
Nesse ciclo, a gente vai optar por competir muito menos, porque o meu sonho ainda é ser um medalhista olímpico. Mas, para isso, tenho que diminuir o número de lesões. Em Londres, cheguei com muitas lesões. Não quero mais um ano com tantas cirurgias, tanto tempo sem treinar. Então, estamos combinando de competir este ano o Nacional, o Troféu Brasil, uma etapa da Copa do Mundo, o Campeonato Mundial e possivelmente algum amistoso. Até 2016, pretendo competir 19 vezes. O objetivo não é mais ganhar experiência. É até uma questão de saúde. Está sendo difícil voltar agora depois de tantas cirurgias. Sei que vou ter uma lesão ou outra, mas quero tentar não operar e, se operar, que seja uma vez e longe das Olimpíadas.

==> Fonte: Globoesporte

==> Foto: Lydia Gismondi / Globoesporte

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