Londres, dia 13: quando detalhes são coisas muito grandes para esquecer

Detalhes tão pequenos, avisou Roberto Carlos (o cantor, não o ex-lateral-esquerdo), são coisas muito grandes para esquecer. Ô, se são. A matemática, essa traiçoeira, gosta de mostrar seu valor em Olimpíadas: um pedaço de centímetro aqui, uma fatia de segundo ali, uma bobagenzinha de nada acolá. E assim, num piscar de olhos, lá se vai uma medalha. Que o diga o brasileiro Diogo Silva, quarto colocado no taekwondo. Que o digam Alison e Emanuel, medalha de prata no vôlei de praia.
Há detalhes que valem quatro anos. Para o bem e para o mal. Nesta quinta-feira, foi para o mal – pensando no nosso umbigo brasileiro, claro. Pequenos detalhes tiraram Diogo Silva primeiro da final, depois do pódio. Pequenos detalhes transformaram em prata o ouro que parecia reluzir para Alison e Emanuel. Quase.
Mas também há detalhes que são grandes demais para esconder. Usain Bolt voltou a ganhar. Com tempo de sobra. Já era bicampeão nos 100m, e agora é nos 200m. E a seleção feminina de vôlei também escancarou superioridade. Encontrou espaço para dar, vender e emprestar na quadra adversária: 3 sets a 0 sobre o Japão e vaga na final.
Por segundos
Nos três minutos de cada round, um segundo pode valer uma eternidade. Diogo Silva dorme nesta quinta-feira sabendo disso melhor do que ninguém. Ao chegar às semifinais do taekwondo e encarar o iraniano Mohammed Bagheri Motamed, vice-campeão mundial, ele teve que congelar os ponteiros para, nos instantes finais, faltando três segundos, encaixar um golpe surreal, coisa de filme de artes marciais, e empatar a batalha em 5 a 5 – ele perdia por 5 a 1, e o golpe rodado na cabeça do adversário valeu quatro pontos. Foi por muito pouco, no detalhe, que ele conseguiu levar a disputa ao golden score, uma espécie de prorrogação.
Nela, os detalhes voltaram a prevalecer. Nenhum dos atletas pontuou. A decisão caiu no colo da subjetividade dos árbitros. Eles teriam que analisar os prós e contras de cada um e indicar quem merecia vaga na final. E optaram pelo iraniano. Uma injustiça, na visão do brasileiro, que adotou uma espécie de protesto sócio-político para questionar a decisão.
- O Irã dá até petróleo para ele (Motamed). Toda fonte de recursos de lá vai para o taekwondo. Lutei contra o Neymar, praticamente. Foi o árbitro que tomou a decisão. Não perdi a luta. Numa semifinal de Jogos Olímpicos, seria melhor o árbitro rever, analisar melhor e não tomar a decisão com emoção. (…) Estamos falando de astros e operários. Eu sou operário. Ele tem investimento comparável a Michael Phelps, a LeBron James. Eu tenho investimento comparável a atleta de categoria de base. Talvez um dia poderemos competir de astro para astro.
Restou a luta pelo bronze para Diogo. E detalhes que sequer podem ser contados em um estalar de dedos, de tão rápidos, foram decisivos. O brasileiro acertou um golpe no americano Terrence Jennings quando a luta se encaminhava para o final, novamente com empate. Era esperar o golden score mais uma vez. Ou não. Faltando menos de um segundo, o adversário atingiu a cabeça do paulista. Repitamos: faltava menos de um segundo. Foi no exato instante em que o cronômetro migrou do um para o zero. Naquele triz, Diogo perdeu a medalha.
Chateado, mas orgulhoso, o brasileiro encerrou sua participação com o quarto lugar. E com mais um desabafo.
- Eu tenho quase certeza de que o placar tinha zerado (antes do golpe final). Eu não vi a luta em câmera lenta, mas eu tenho certeza que o placar tinha zerado. Os pontos só podem ser dados ao final do primeiro e do segundo round, é uma regra mundial. Eles mudaram só para os Jogos Olímpicos. Eu acho que você tem que ter poder político. Nosso esporte não tem poder político – disse ele ao SporTV.
O ouro ficou com o turco Servet Tazeguil. Mohammed Bagheri Motamed levou a prata.
Por centímetros
Alguém teria que vencer. E vencer por detalhes, por muito pouco, por centímetros. Alison e Emanuel deram provas, ao longo dos Jogos, de que eram uma dupla muito, muito, muito forte. Mas os alemães Brink e Reckermann, campeões mundiais em 2009, ofereceram os mesmos avisos. Por exemplo: eliminaram Ricardo e Pedro Cunha nas quartas de final.
Foi tão equilibrado quanto poderia ser. No primeiro set, vitória dos alemães – 23/21; no segundo, troco dos brasileiros – 21/16. Tie-break. E um sofrimento danado…
Alison e Emanuel começaram melhor o set final. Mas os adversários reagiram. E abriram vantagem. Tudo parecia perdido quando eles alcançaram 14 a 11. Mas a dupla brasileira salvou o primeiro match-point. E o segundo. E o terceiro. Incrível: 14 a 14.
Quando bateu o otimismo, veio a queda. Os dois pontos seguintes foram dos alemães. O último foi um ataque para fora de Emanuel. Por centímetros. Por detalhes. Enquanto os alemães comemoravam, eufóricos, os brasileiros olhavam para a marca da bola na areia, alegando que tinha sido dentro. Mas não foi. Por alguns grãos, não foi.
Por uma eternidade
Usain Bolt sobra. Mesmo nesta quinta-feira, quando mais pareceu ameaçado, o jamaicano teve tempo de brincar. Cruzou a linha dos 200m com o indicador na frente da boca, como se pedisse silêncio ao estádio. É a quinta medalha olímpica dele: duas nos 100m, duas nos 200m, outra nos 4x100m.
Bolt é o primeiro homem na história a conquistar dois títulos seguidos nos 100m e nos 200m. Não ter quebrado os recordes mundial e olímpico não é grande problema: as marcas anteriores são dele mesmo. O fenômeno venceu com 19s32. E viu dois compatriotas chegarem pouco depois dele. Seu maior concorrente, Yohan Blake, ficou com a prata, com 19s44. Warren Weir foi bronze, com 19s84.
No sábado, Bolt buscará seu sexto ouro – o terceiro em Londres. Mas a vitória nos 4x100m será apenas enfeite. Ele já conseguiu o que queria, como disse depois de fazer flexões, brincar com o público e tirar fotos de Blake com uma máquina tomada emprestada de um jornalista:
- Agora eu sou uma lenda.
Por uma imensidão
É bem verdade que a vitória histórica sobre a Rússia nas quartas de final, depois de salvar seis match-points, havia dado moral às brasileiras. Mas soaria otimismo exagerado esperar uma vitória tão fácil sobre o Japão. Sheilla, Jaqueline, Dani Lins e sua turma passearam nas semifinais: 3 sets a 0.
Venceram por uma imensidão. As parciais escancaram a superioridade: 25/18, 25/15, 25/18. Fabiana e Sheilla foram as maiores pontuadoras da partida – 13 cada, seguidas por Thaisa, com 12, quatro deles de bloqueio.
A final será sábado. E contra o osso mais duro de roer. Os Estados Unidos chegaram lá ao fazer 3 sets a 0 na Coreia do Sul – parciais de 25/20, 25/22 e 25/22. Hooker, a craque do time, fez 24 pontos. Quase um set inteiro…
Resultados dos brasileiros
Poliana Okimoto chegou a Londres como candidata a figurar no pódio da maratona aquática. Mas parou em uma adversária sempre temida por ela: a hipotermia (quando a temperatura do corpo fica abaixo de 35 graus). Na quinta das seis voltas, a brasileira desistiu. Ao sair do lago, a atleta teve um desmaio e foi levada de cadeira de rodas para o centro médico. Ela passa bem.
No atletismo, o Brasil avançou à final dos 4x100m para mulheres. A equipe verde-amarela, formada por Ana Cláudia Silva, Franciela Krasucki, Evelyn Carolina e Rosângela Santos, terminou em quarto na primeira bateria e avançou para a decisão com o sexto melhor tempo do dia - 42s55. As mais rápidas foram as americanas, com 41s64.
No decatlo, Luiz Alberto de Araújo não teve bom desempenho nas três provas que disputou na manhã desta quinta-feira e caiu para a 17ª colocação geral. Ao fim do dia, perdeu mais um pouco de espaço e encerrou sua participação em 19º. O ouro foi para o americano Ashton Eaton.
O dia também apresentou brasileiros na canoagem. Erlon Silva e Ronilson Oliveira disputaram a final B da categoria C2 (canoa para duas pessoas) de 1.000m, ficaram em segundo e, assim, fecharam sua participação nos Jogos de Londres com a décima colocação.
O país do futebol (feminino)
Os Estados Unidos são o país do futebol. Do futebol feminino. As americanas conquistaram nesta quinta-feira seu quarto título olímpico, o terceiro consecutivo. Elas garantiram o ouro ao bater o Japão por 2 a 1. A camisa 10 Lloyd fez os dois gols da conquista. Ogimi descontou. O bronze ficou com o Canadá.
A potência olímpica também está na final do basquete feminino. Favoritas ao título, as americanas bateram a Austrália por 86 a 73 e agora pegam a França, que fez 81 a 64 na Rússia. A decisão será no sábado.
No handebol, a Noruega, algoz do Brasil nas quartas de final, bateu a Coreia do Sul por 31 a 25 e garantiu vaga na final. As atuais campeãs olímpicas e mundiais defenderão seu reinado contra Montenegro, que bateu a Espanha por 27 a 26. O ouro será decidido no sábado.
O atletismo, além do passeio de Bolt, teve dois momentos marcantes. No revezamento 4x400m, a África do Sul ganhou lugar na final graças ao tapetão. A equipe africana havia sido eliminada na classificatória, por causa de um tropeço de Ofentse Mogawane. Ele deixou o bastão cair e não teve como passá-lo para Oscar Pistorius, o atleta que corre com próteses. Mas os sul-africanos entraram com recurso, e foi observado que Mogawane caiu porque foi empurrado pelo queniano Vincent Kiliu. Com isso, a final da prova, nesta sexta-feira, terá nove equipes.
Nos 800m, o queniano David Rudisha se superou. Com 1m40s91, conquistou o ouro e bateu sua marca anterior, o antigo recorde mundial, que era de 1m41s01. Campeão do mundo na distância, o atleta de 23 anos é filho de Daniel Rudisha, um corredor de 400m que levou a medalha de prata nos Jogos de 1968, na Cidade do México.
Foi um ouro batizado por um padre. Rudisha despertou a atenção do religioso irlandês Colm O´Connell quando tinha 14 anos e participava de uma competição escolar de 200m. O garoto, saído de uma tribo em que as pessoas vivem em pequenas cabanas feitas de esterco de vaca e estacas de madeira, foi convidado pelo padre a participar de um treinamento especial em um dos 120 campings criados por ele no Quênia. Não poderia ter dado mais certo.
==> Fonte: Globoesporte
==> Foto: Reuters

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